Há alguma relação entre a Raabe do livro de Jó (9.13; 26.12) e a
personagem do livro de Josué 2.1? Como entender essas passagens do texto
bíblico?
Sabemos que o livro de Josué está
cronologicamente situado após o êxodo do povo hebreu e durante a conquista de
Canaã. É quase consensual entre os estudiosos ortodoxos que a autoria do livro
é do próprio Josué, que narra fatos dos quais ele fora testemunha ocular, o que
dá ainda mais fidedignidade historiográfica ao seu relato.
O livro de Jó,
porém, tem a sua autoria desconhecida. Há muita especulação no campo acadêmico
acerca de quem possa ter sido seu autor. Os pareceres giram em torno do próprio
Jó, Eliú, Moisés, Salomão, Isaías, Ezequias, Jeremias, Baruque e Esdras.
No entanto, depreendemos por evidências
internas do livro que a história de Jó se passa no período patriarcal.
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Apontamos algumas razões:
(1) Nos é dada a informação de que Jó
viveu mais 140 anos depois que Deus lhe restaurou os bens e filhos. Nos
primeiros capítulos do livro, a Bíblia diz que os filhos de Jó eram já
crescidos, e por inferência cremos que tinham suas próprias casas e famílias.
Portanto, Jó já devia ter uma idade avançada. Desse modo, é provável que Jó
tenha vivido cerca de 200 anos, algo semelhante a Abraão, que viveu 175 anos.
(2) Jó tinha sua riqueza contabilizada
tendo como base a quantidade de animais que possuía, não em moeda, exatamente
como na época patriarcal.
(3) Ele era o próprio sacerdote de sua
família, e sacrificava por ela, ou seja, viveu antes da instituição do
sacerdócio levítico.
(4) Não há nenhuma referência à Lei e nem
aos costumes religiosos da época de Moisés. Isso posto, salientamos que de
acordo com os registros cronológicos e históricos, a saída do povo de Israel do
Egito ocorre em meados século XV a.C., e o período dos patriarcas situa-se no
século XX a.C., ou seja, há uma distância temporal de aproximadamente meio
milênio entre as duas narrativas.
A Raabe mencionada no livro de Josué (Js
2.1), que hospedou os espias em sua casa e os escondeu, posteriormente se
converteu ao Deus de Israel, e não foi morta na destruição da cidade de Jerico,
juntamente com sua família (Js 6.25). Ela tornou-se progenitora de Davi e de
Jesus, sendo mencionada na genealogia do Salvador (Mt 1.5); e viveu séculos
depois do contexto do livro de Jó. Pontuando essas questões elucidativas, vamos
resolver a questão proposta. Essa confusão de “Raabes” ocorre porque algumas
versões modernas da Bíblia, como a Nova Almeida Atualizada (NAA), a Almeida
Edição Contemporânea (AEC) e a Nova Versão Internacional (NVI), inseriram o
nome Raabe em Jó 9.13 e 26.12 (a NVI, só em Jó 9.13). Senão, vejamos: “Deus não
revogará a sua própria ira; debaixo dele se curvam os ajudantes do monstro
Raabe”; “Com a sua força dominou o mar e com o seu entendimento despedaçou o
monstro Raabe” (Jó 9.13; 26.12, NAA).
O vocábulo "Raabe” no
hebraico é “rahab” e tem alguns significados: “cavaleiros”, “ferocidade”,
“largo” ou “tumulto”. A expressão também é usada como referência ao mar ou a um
mito do “monstro do mar”, que liga a palavra ao Egito como símbolo do orgulho
(S1 87.4; 89.10; Is 30.7; 51.9).
Se lermos o mesmo texto na versão Almeida
Revista e Atualizada (ARC), o “problema” estará resolvido: “Deus não revogará a
sua ira; debaixo dele se encurvam os auxiliadores soberbos”; “com a sua força
fende o mar e com o seu entendimento abate a sua soberba” (Jó 9.13; 26.12, ARC).
Portanto, a Raabe mencionada em Josué é uma personagem literal e histórica,
confirmada como tal nos dois Testamentos. Já o termo “Raabe” citado em Jó é uma
linguagem figurada que simboliza o Egito e a soberba.
Artigo: Pb. Geovane Leite
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