Ao
examinar as Sagradas Escrituras, todo estudante atencioso deparar-se-á com uma
maravilhosa e vasta coleção de 66 livros, nos quais é patente duas divisões
principais: Antigo e Novo Testamento. Para muitos esta primeira divisão, o
Antigo Testamento, é em determinadas situações desconcertante para a mente e
psicologia do homem moderno.
Porém, para que haja um verdadeiro entendimento
sobre a natureza e autoridade do Antigo Testamento, torna-se imprescindível
compreender de fato por que se faz necessária à sua inclusão nas Escrituras
usadas pelos cristãos. Em relação a essa importância e conteúdo tratados pelas
Escrituras Veterotestamentárias, Yancey apropriadamente observa:
Sem
o Antigo Testamento sempre teremos uma visão empobrecida de Deus. Deus não é um
conceito filosófico, mas uma pessoa que age na história: aquEle que criou Adão,
fez a promessa a Noé, chamou Abraão e se apresentou pelo nome a Moisés,
humilhando-se ao habitar numa tenda no deserto só para viver perto de seu povo.
Desde o primeiro capítulo de Gênesis, Deus sempre quis ser conhecido, e o
Antigo Testamento é a melhor revelação a respeito de como Deus é. Deste modo,
percebe-se que a Bíblia é composta por duas partes principais: Antigo e NovoTestamento. A divisão entre Antigo e Novo Testamento não é artificial,
porquanto os escritores neotestamentários chamam “Antiga” a primeira aliança
(Hb 8.13), e de “Nova” (1 Co 11.25) a segunda.
1. TERMINOLOGIA
O
termo “testamento”, empregado à primeira divisão das Escrituras, trata-se da
tradução do vocábulo grego diateké2 que procede do original hebraico bent
e significa “aliança, pacto ou contrato”. Em seu aspecto usual, a palavra
“testamento” significa o ato pelo qual alguém se dispõe de seus bens antes da
sua morte. Em sentido bíblico, designa a coleção dos escritos que contêm os
documentos da primeira aliança que Deus fez com o homem. A expressão “Antigo
Testamento” foi popularizada pelos Pais da Igreja com o intuito de distinguir
as Escrituras Cristãs das Escrituras Judaicas. Um termo técnico alternativo
dado por Tertuliano, Jerônimo e Agostinho foi instrumentum que, em
acepção jurídica, designava um documento comprobatório.
2. O CÂNON DO ANTIGO TESTAMENTO
a)
Etimologia
A
palavra cânon deriva do grego kanõn que, por sua vez, origina-se do
hebraico qãneh, termo das Escrituras veterotestamentárias que significa
“vara ou cana de medir” (Ez 40.3). O junco ou a cana era usado como instrumento
para medir, e a partir desse uso comum o kanõn passou a significar “regra
ou padrão”, como confirmam os textos de Gálatas 6.16; Filipenses 3.16; 2
Coríntios 10.13-16. O uso de cânon representando o conceito de padrão já era
conhecido antes mesmo da era cristã. Os clássicos gregos usavam o termo no
sentido de regra, norma ou padrão.
b)
Evolução do Conceito “Cânon”
No
ano 350 a.D., o termo foi aplicado por Atanásio à Bíblia, referindo-se aos
livros que a igreja reconhecia oficialmente como padrão e conduta de fé. O
Concílio de Laodiceia em 363 A.D. usou o vocábulo no mesmo sentido em que foi
empregado por Atanásio, designando que nenhum tipo de obra privada deveria ser
lida nas igrejas, como também os livros não canônicos do Antigo e Novo
Testamentos que se achavam circulando entre a comunidade cristã, juntamente com
estes.
Por
meio da declaração do Concílio de Laodiceia, o Cânon passou a designar a
coleção de livros aprovados pelo uso regular no culto público e no ensino da
igreja. Portanto, do ponto de vista cristão, o Cânon contém os escritos dados à
Igreja pela operação de Deus — a sua palavra, seu evangelho, seu apelo, suas
promessas. Toda essa revelação é cristocêntrica. Nela a Igreja encontra a base
de sua fé, seu culto, suas doutrinas e sua vida. Com a evolução do estudo da
Isagoge ou Introdução Bíblica, o termo “Canônica” passou a designar o estudo da
fixação histórica do Cânon Sagrado, enquanto “Canonização” aos livros que foram
oficialmente reconhecidos como regra de fé e prática.
c)
Nomes Canônicos
Os
nomes canônicos mais comuns do Livro Sagrado no Antigo e Novo Testamento são:
1
- LIVRO
a) O Livro (Êx 17.14; Dt 28.58;29.20,27; Is
29.18)
b) Livro desta Lei (Dt 28.61)
c) Livro do Senhor (Is 34.16)
2
- ESCRITURA
a) Escritura da Verdade (Dn 10.21)
b) Escritura de Deus (Êx 32.16)
c) Sagradas Letras (2Tm 3.16)
d) Escrituras (Mc 15.28; Lc 4.21)
3
- LEI
a) Lei do Senhor (Sl 1.1, 2; Ed 7.10)
b) Lei de Moisés (Lc 24.44,45)
c) Lei Js 1.7,8; Mt 12.5; Jo 1.45)
d) Lei de Deus Js 24.26)
4
– PALAVRAS
a)
Palavras Jr 15.16)
b)
Palavras do Senhor Jr 22.29; 2.31; Am 8.11-13)
c)
Palavra de Deus (Mt 15.6; At 6.7; 12.24; 19.20)
b)
Palavra de Cristo (Rm 10.17; Cl 3.16)
5
- ORÁCULO
a)
Oráculo de Deus (Rm 3.2; Hb 5.12; 1 Pe 4.11)
Os
registros desses apelativos revelam o valor e a consideração que tanto os
hagiógrafos quanto a comunidade primitiva do Antigo e Novo Testamento atribuíam
à Sagrada Escritura como proveniente da ação direta do Senhor.
3. ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DO
CÂNON
O
processo da origem e desenvolvimento do Cânon envolve três aspectos: revelação,
inspiração e canonização.
A)
Revelação.
O
hebraico bíblico possui diversas palavras que correspondem ao termo “revelação”
na língua portuguesa. Contudo, o vocábulo gâlâ, isto é, “descobrir”,
“revelar”, “tirar” é usado em sentido reflexivo com o significado de
“desnudar-se” ou “revelar-se”, como por exemplo, na revelação de Deus a Jacó
(Gn 35.7). A Septuaginta traduz o vocábulo da respectiva passagem por epephanê,
“manifestação”, “aparição” ou “revelação” (epifania).
O
grego neotestamentário, por sua vez, emprega a palavra apokalypsis com o
sentido de “revelar” ou “desvendar”. Lucas (2.32), por exemplo, emprega a
palavra com a conotação de “tirar o véu”, “revelar” — phôs eis
apokalypsin. Em seu aspecto geral ou particular, revelação sempre está atrelada
aos conceitos de “manifestar”, “tornar claro”, “tirar o véu”, “dar a conhecer”
(Rm 16.25).
A
doutrina da revelação de Deus nas Escrituras descreve a comunicação, revelação
e manifestação de Deus ao homem. Ele revela sua mensagem, vontade e propósitos.
Deste modo, Revelação é um ato amoroso pelo qual Deus se dá a conhecer e comunica
sua vontade às criaturas humanas. Essa revelação, de acordo com a origem e
desenvolvimento do Cânon Sagrado, é a comunicação sobrenatural desconhecida do
hagiógrafo. Por meio da revelação, verdades anteriormente ignoradas pelo
hagiógrafo foram reveladas.
B)
Inspiração.
O
sentido teológico de “inspiração divina” é derivado da expressão paulina de 2
Timóteo 3.16. A expressão “divinamente inspirada”, no grego theopneustos,
é formada por dois vocábulos theos (Deus) epneustos (inspiração,
influxo). A Vulgata traduz por divinitus inspirata. De acordo com
o texto canônico de 2 Timóteo 3.16, as Escrituras são produtos do sopro criador
de Deus. Por meio da inspiração divina, o conteúdo das Sagradas Escrituras não
é proveniente da sabedoria e aferimento humano, não sendo produto pessoal da
mente do escritor (2 Pe 1.19-21).
Paulo
reconhece seus escritos como inspirados por Deus quando assevera: “[...] não
com palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas com palavras ensinadas pelo
Espírito [didakitoispneumatos]” (1 Co 2.13, NVI; cf. 1 Co 14.34; G1
1.6-12). Deste modo, inspiração é a influência sobrenatural exercida pelo
Espírito Santo sobre os hagiógrafos, em virtude do qual seus escritos se
constituem suficiente e infalível regra de fé e prática.
Todo
o Antigo Testamento é inspirado por Deus (2 Tm 3.16; 2 Pe 1.19-21; Lc 11.51;
12.3,39-41). E significativo o argumento de Cristo em Lucas 11.51.
Ao
citar “de Abel até o sangue de Zacarias”, Jesus está referindo-se ao Cânon
Judaico da “Tanach”. “Abel” encontra-se no livro de Bereshith
(Gênesis), que é o primeiro livro da primeira divisão conhecida como Torá ou
Lei; “até Zacarias”, encontra-se no livro de Drive Hayamim em 1 e 2 Crônicas e
corresponde ao último livro da terceira divisão da “Tanach”, conhecida como “Kethuvim”
ou Escritos. Em Lucas 24.44,45, Cristo refere-se à tríplice divisão da “Tanach”,
referindo-se à Lei de Moisés (Torá — 1ª divisão), Profetas (2ª divisão) e
Salmos (o primeiro livro da 3ª terceira divisão). Assim, Cristo confirma toda a
inspiração bíblica do Antigo Testamento.
C)
Canonização.
Canonização
é o reconhecimento e acolhimento dos escritos que contêm a divina revelação e
que são inspirados por Deus. A igreja não criou o Cânon, apenas o recebeu,
reconhecendo a autoridade que ele possui em si mesmo. A função da Igreja a
respeito do Cânon foi a de reconhecer e acolher, e não escolher. A autoridade
dos livros da Sagrada Escritura não advém de uma autoridade externa, como a
igreja ou a tradição, mas de uma autoridade interna, isto é, de si mesmos.
Referência:
BENTHO Esdras Costa | PLÁCIDO Reginaldo Leandro. Introdução ao estudo do Antigo
Testamento, 1ª edição 2019, CPAD
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