1. Sobre os Demônios no Novo Testamento
Os demônios aparecem com
frequência no Novo Testamento como "espírito imundo" (Mt 12.43; Mc
1.23, 26; 3.30; 5.2, 8; 7.25; 9.25; Lc 8.29; 9.42; Lc 11.24); "espírito
mudo" (Mc 9.17); "espírito" (Mc 9.20); "um espírito"
(Lc 9.39); "espírito de demônio" (Lc 4.33); "espírito de
adivinhação" (At 16.16) e "espírito maligno" (At 19.15, 16).
Já nos Evangelhos e em Atos, os
demônios aparecem em oposição Jesus, com ênfase na superioridade de Cristo
sobre eles. Nos escritos paulinos, são principados, dominações e potestades (1
Co 15.24, 27; Cl 1.15-20; Ef 1.20-2.2). No Apocalipse, os demônios com o diabo
estão presentes na luta final contra Jesus e a igreja.
Apesar da sua presença nos
relatos dos evangelhos sinóticos e em Atos dos Apóstolos, a origem deles é
considerada obscura por alguns. A melhor compreensão de como esses espíritos
surgiram depende também da origem de Satanás, pois ele é chamado de Belzebu, "o
príncipe dos demônios" (Mt 12.24; Mc 3.22; Lc 11.25). Jesus faz menção do
"diabo e seus anjos" (Mt 25.41).
2. Quem são esses anjos e qual a origem
deles e do seu chefe?
O Novo Testamento faz menção
de anjos rebeldes que foram expulsos do céu (2 Pe 2.4; Jd 6). Muitos consideram
Isaías 14.12-15 e Ezequiel 28.12- 15 como referências à origem e à queda de
Satanás.
Alguns pais da Igreja como
Orígenes, Jerônimo, Ambrósio de Milão e Agostinho de Hipona, entre outros,
ligaram Isaías 14.12- 15 a Lucas 10.18 e Apocalipse 12.7-9 e, dessa forma,
consideram a passagem como uma referência a Satanás. Mas grandes expositores da
Reforma Protestante foram unânimes em não endossar essa ideia. Lutero e Calvino
disseram que seria um erro aplicar o nome de Satanás aqui.
Os comentários atuais dessa
passagem costumam pular essa parte e se resumem geralmente nisso: Isaías usa
uma linguagem da mitologia para descrever o orgulho humano na figura de
Nabucodonosor em "Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da
alva!" (Is 14.12). A estrela da alva é o planeta Vênus que as nossas
versões traduzem geralmente como "estrela da manhã". Jerônimo usa
"Lúcifer" na Vulgata Latina, termo que significa "portador de
luz" e é um dos nomes aplicados a Satanás.
Gustav Davidson, em A
Dictionaiy ofangels including the fallen angels (Dicionário dos anjos incluindo
os anjos caídos), afirma que essas palavras em Isaías se referem a
Nabucodonosor, rei de Babilônia, e que são interpretadas erroneamente como se
referindo à queda de Satanás. Mas Orígenes disse: "O que caiu do céu não
pode ser Nabucodonosor nem nenhum outro ser humano". E, em outras
palavras, ele reitera essa ideia no Tratado sobre os princípios, livro 1.5.5;
livro 4.3.9. Agostinho de Hipona segue também nessa mesma linha de pensamento
em Sobre a doutrina cristã e A cidade de Deus.
3. Referência à queda de Satanás
A passagem de Ezequiel
28.12-15 sobre o rei de Tiro é também vista pelos pais da Igreja como
referência à queda de Satanás, tal como Isaías 14.12-15, com discordância da
maioria dos reformadores do século 16.0 texto sagrado descreve esse rei como o
aferidor da medida: "Tu eras o selo da simetria e a perfeição da sabedoria
e da formosura" (v. 12, TB); que estava no Éden, jardim de Deus, mas um
jardim de pedras preciosas (vv. 13, 14); era o querubim ungido e perfeito em
todos os seus caminhos (vv. 14, 15). Essas características ultrapassam a de
qualquer ser humano.
Uma passagem no Novo
Testamento está em Lucas 10.18, quando Jesus disse: "Eu via Satanás, como
raio, cair do céu" ou "Eu vi Satanás caindo do céu como
relâmpago".
A questão é: quando
aconteceu ou vai acontecer essa queda de Satanás?
O ponto-chave é o tempo
verbal, "eu via", imperfeito, segundo a Chave linguística do Novo
Testamento grego, "indica aquilo que era constantemente repetido", ou
seja, uma ação contínua; em seguida, vem um comentário de Lucas: "Cada
expulsão de demônios importava numa queda de Satanás" (p. 126). Jesus via
a derrocada do reino das trevas enquanto os setenta discípulos pregavam.
A
segunda interpretação considera as palavras de Jesus como
referência à queda de Satanás como apresentada em Isaías 14.12-15 e Ezequiel
28.12-15, ideia aceita por pais da Igreja como Cipriano, Ambrósio e Jerônimo,
entre outros.
O comentário bíblico NVI, de F. F. Bruce, afirma:
Visto que esse dito lembra
Isaías 14.12 - "Como você caiu dos céus, ó estrela da manhã, filho da
alvorada!" - tem sido interpretado ao longo da história cristã como uma
referência a uma queda cósmica de Satanás no passado remoto, Gregório, o
Grande, já interpretava no longínquo século VI. Mas Plummer (p. 278) diz: 'O
aoristo indica a coincidência entre o sucesso dos Setenta e a visão de Cristo
da derrota de Satanás" (p. 1668).
O Comentário bíblico pentecostal do Novo
Testamento apresenta três opiniões:
1) Baseado em Isaías 14.12,
o Cristo preexistente testemunhou a queda de Satanás.
2) Jesus testemunhou a queda
de Satanás na tentação do deserto (Lc 4.1-12), quando Jesus estabeleceu sua
autoridade sobre todas as forças das trevas.
3) Jesus teve uma visão
enquanto os setenta e dois estavam ministrando sob sua autoridade. Esta
terceira opção é provavelmente a explicação correta. Enquanto eles estavam
desempenhando a missão, Jesus viu Satanás cair do céu como a subtaneidade de um
raio. Esta visão se relaciona com as vitórias dos discípulos sobre os poderes
do mal.
A descrição Apocalipse
12.7-10 parece ter acontecido com a chegada de Jesus no céu: "E deu à luz
um filho, um varão que há de reger todas as nações com vara de ferro; e o seu
filho foi arrebatado para Deus e para o seu trono" (v. 5). Na sequência, a
partir do v. 7 vem a batalha do arcanjo Miguel contra o Dragão em Apocalipse.
Se realmente é isso, logo não se deve aplicar essa batalha à queda original de
Satanás descrita em Isaías 14.12, mas nem por isso deixa de ser a uma guerra
cósmica espiritual e invisível aos olhos humanos.
Satanás tinha acesso ao céu depois de sua
queda conforme Isaías 14.12?
Muitos expositores bíblicos
admitem essa ideia, mas que se tratava de um acesso com certa restrição. Essas
evidências aparecem em algumas passagens do Antigo Testamento (1 Rs 22.23; Jó
1.6-9; 2.1-6; Zc 3.1, 2). É com base nessas passagens que Satanás é chamado de
"o acusador de nossos irmãos" (Ap 12.10). A Bíblia de Estudo
Pentecostal deixa transparecer essa interpretação: "Satanás é derrotado,
precipitado, na terra" (cf. Lc 10.18) e não lhe é mais permitido acesso ao
céu". Stanley M. Horton segue também nessa mesma linha de pensamento em
seu comentário sobre o livro de Apocalipse.
Mas, com a chegada vitoriosa
de Jesus ao céu, não se achou lugar para o acusador dos irmãos, e assim não foi
mais possível o acesso de Satanás e seus correligionários ao céu, pois eles
"não prevaleceram; nem mais o seu lugar se achou nos céus" (Ap 12.8).
Jesus morreu por todos os pecadores e intercede por sua Igreja, e nisso temos o
grito de vitória:
E
foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, chamada o diabo e Satanás,
que engana todo o mundo; ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram
lançados com ele. E ouvi uma grande voz no céu, que dizia: Agora chegada está a
salvação, e a força, e o reino do nosso Deus, e o poder do seu Cristo; porque
já o acusador de nossos irmãos é derribado, o qual diante do nosso Deus os
acusava de dia e de noite (Ap 12.9, 10).
Fonte: SOARES, Esequias/ SOARES, Daniele. Batalha Espiritual. O povo de Deus e a Guerra Contra as Potestades do Mal. 1ª edição de 2018 - CPAD