A Coleção dos Evangelhos
Dá-se geralmente o nome de "Quatro
Evangelhos" aos primeiros livros do Novo Testamento. Antes do século IV, todavia, a coleção era designada apenas pelo
nome de "O Evangelho", distinguindo-se as diferentes formas por
"segundo Mateus", "segundo Marcos", etc.
Além do Evangelho Escrito, recordado pelos quatro
evangelistas, havia ainda o Evangelho Falado ou Oral, a boa nova (euangelion)
proclamada por Cristo e pelos discípulos.
O emprego da palavra e seus derivados provêm do verbo euangelizomai
da Septuaginta nas seguintes passagens do Antigo Testamento: Isaías 40.9;
52.7; 61.1 (veja-se como Cristo aplicou a Si próprio este último texto - Lucas
4.18).
Testemunhos Antigos
sobre os Evangelhos
1. Irineu e os Evangelhos
Irineu, bispo de Leão, na Gália, escrevendo
cerca do ano 180, considera os Quatro Evangelhos como um dos fatos mais
incontestáveis do universo. "Assim como a terra consta de quatro
continentes", - escreve o famoso bispo, - "assim como os
ventos são quatro, assim também é natural que a Igreja Universal se baseia em
quatro fortes colunas, que são os Quatro Evangelhos". Para assim falar
tão categoricamente acerca do número dos Evangelhos, é porque no seu tempo e em
todas as igrejas se admitiam esses Quatro Evangelhos.
Tal
ideia, no entanto, levou tempo a concretizar-se, como é fácil verificar, ao
traçar a história dos Evangelhos desde o tempo de Irineu até no princípio do
segundo século.
O
"Cânon Muratoriano"
fala-nos do reconhecimento dos Quatro Evangelhos pela Igreja Romana ainda no
tempo de Irineu, o mesmo podendo dizer-se dos prólogos antimarcionistas aos
Evangelhos escritos alguns anos antes.
2.
Taciano
Taciano,
cristão assírio, cerca do ano 170 formou dos Quatro Evangelhos uma narrativa
contínua ou "Harmonia dos Evangelhos", conhecida pelo nome de
Diatessaron, e que durante muito tempo foi a versão siríaca favorita, embora
não oficial, dos Quatro Evangelhos que a Igreja da Assíria lia aos seus fiéis.
Taciano
era discípulo do mártir Justino, em cujas obras se aludem as "Memórias dos Apóstolos". Justino
não fala de Mateus, Marcos ou Lucas, nem se refere a João como evangelistas,
mas é mais que certo ter utilizado todos os Evangelhos, referindo-se a Marcos
como Memórias de Pedro, e revelando
manifesta influência em toda a obra dos Quatro Evangelhos, se bem que por vezes
se note um ou outro apontamento talvez inspirado nos Evangelhos pseudônimos de
Pedro ou de Tomé.
Enquanto
Justino assim escrevia em Roma, publicava-se na Ásia Menor uma obra com o
título "Epístola dos Apóstolos",
que vem confirmar os Quatro Evangelhos.
Em
1935 foram publicados pelo Museu Britânico fragmentos duma obra que se supõe
ser um manual para instruir os crentes sobre a história dos Evangelhos. O que
nos interessa sobremaneira, é que essa obra remonta a primeira metade do século
II e deve ter sido composta por alguém que tinha ao lado os Quatro Evangelhos,
obra bem conhecida sua, que segue passo a passo nas suas considerações.
Ainda da mesma época
podemos citar outra obra de origem docética,
o Evangelho de Pedro, escrito na Ásia na primeira década do século II, a demonstrar também que o autor possuía um
conhecimento perfeito dos Evangelhos Sinóticos, e possivelmente também do
Quarto Evangelho.
3. Papias
Nas primeiras décadas
do mesmo século, Papias, bispo de Hierápolis, na Frigia, escreveu as suas Exposições
dos Oráculos do Senhor em que se refere expressamente ao Evangelho de
Marcos e à compilação das palavras do Senhor feita por Mateus. Provavelmente
teve presente a obra de Lucas e, se dermos crédito ao Prólogo ao Quarto
Evangelho antimarcionista, Papias falou de João ditando o seu Evangelho
"ainda em vida", para que as igrejas o conhecessem.
Eusébio, a cujas citações devemos quase todo o
conhecimento que temos desta última obra de Papias, nada afirma das referências
feitas por este autor acerca do Evangelho de João; e em presença da profunda
relação entre aquela Epístola e o Quarto Evangelho, é muito provável que Papias
tivesse também conhecimento do Evangelho. Há razão, portanto, para pensarmos
que o ajudou a divulgar e que por isso o reconheceram as igrejas da Ásia.
Já que nos é lícito
provar a existência e o reconhecimento dos Quatro Evangelhos nos primeiros anos
do século II,
é-nos lícito também
admitir, que as referências de Inácio (cerca de 110) ou da Didache ao
"Evangelho", implicam não um só Evangelho, mas a coleção dos Quatro
Evangelhos.
Em suma, é de supor que os Quatro
Evangelhos comecem a aparecerem juntos, logo a seguir à publicação do Evangelho
segundo João. Há um autor que supõe terem sido os mesmos coligidos, em Éfeso,
quinze ou vinte anos após o aparecimento do Evangelho de João, de maneira que
esta obra tivesse a mesma divulgação que os outros Evangelhos.
Conclusão
Seja
como for, podemos ter a certeza de que a coleção dos Quatro Evangelhos data de
cerca do ano 110, data em que se forma uma outra grande coleção do Cânon do
Novo Testamento – as Epístolas de Paulo.
(Fonte:
Curso Médio em Teologia – IBADEP / Reverberação: Subsídios EBD)