A respeito da Epístola aos Romanos, Martinho Lutero escreveu: “Esta epístola é a parte principal do
Novo Testamento, e o mais puro evangelho, que certamente merece a honra de um
cristão não apenas conhecê-la de memória, palavra por palavra, mas de também
dedicar-se a ela diariamente, como alimento para a sua alma. Pois ela nunca
será exaustivamente lida ou entendida. E quanto mais é estudada, mais agradável
se torna, e melhor parece!”
Estudiosos
discutiram a reivindicação de que esta Epístola seja “a parte principal do Novo
Testamento”. Existem fortes razões para afirmar que os Evangelhos detêm esta
distinção, uma vez que eles constituem o testemunho histórico básico de Cristo,
mas devemos concordar com a opinião de que “aprende-se a conhecer o que é o
evangelho, o que é o conteúdo da fé cristã, na Epístola aos Romanos, melhor do
que em qualquer outra parte do Novo Testamento”.
Ao longo dos
séculos, esta Epístola, de uma maneira peculiar, foi capaz de dar o impulso
para a renovação espiritual. Quando a igreja se desviou do evangelho, um
profundo estudo da Epístola aos Romanos repetidamente foi o meio pelo qual se
recuperou a perda.
Agostinho de Hipona
Em um dia de verão
do ano 386 d.C., o brilhante Agostinho de Hipona, professor de retórica em
Milão, sentou-se chorando no jardim de seu amigo Alípio. Depois de escapar das
orações da sua religiosa mãe, Mônica, ele tinha ficado sob a influência do
ministério do bispo Ambrósio, em Milão. Quando ele se sentou no jardim, quase
convencido a romper com a sua antiga vida de pecado, ouviu as vozes de crianças
que brincavam. Ele pensou ter ouvido as palavras: Tolle lege! Tolle lege!
(“Apanhe e leia! Apanhe e leia!”).
Interpretando isto
como sendo uma voz de Deus, ele apanhou o pergaminho que estava ao lado do seu
amigo e deixou que os seus olhos lessem as palavras: “Não em glutonarias, nem
em bebedeiras, nem em desonestidades, nem em dissoluções, nem em contendas e
inveja. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não tenhais cuidado da carne
em suas concupiscências” (Rm 13.13-14). “Eu não li mais nada”, conta ele, “nem era
necessário, pois instantaneamente, ao final destas frases, como se uma luz de
serenidade tivesse entrado no meu coração, toda a escuridão da dúvida se
dissipou”.
Quem pode avaliar
o alcance dos efeitos sobre a igreja e o mundo que teve a iluminação do coração
e da mente de Agostinho?
Martinho Lute
Em novembro de
1515, Martinho Lutero, um monge agostiniano e doutor em teologia sagrada na
Universidade de Wittenberg, iniciou as suas exposições sobre a Epístola aos
Romanos. Ao preparar as suas palestras, ele começou a ver mais e mais
claramente o significado do evangelho de Paulo da justificação pela fé.
“Certamente eu tinha ficado possuído por um incomum e ardente desejo de entender
Paulo na sua Epístola aos Romanos”, escreveu. “Apesar disso, a despeito do
ardor do meu coração, eu me encontrava impedido por uma expressão no primeiro
capítulo: ‘Nele se descobre a justiça de Deus’. Eu detestava esta expressão:
‘justiça de Deus’, porque, de acordo com o uso e os hábitos dos doutores, eu
tinha sido ensinado a entender isso filosoficamente, como significando, como
eles diziam, a justiça ativa ou formal, segundo a qual Deus é justo e pune os
pecadores e os injustos... Dia e noite eu tentei meditar sobre o significado
destas palavras... Então, finalmente, Deus teve misericórdia de mim e comecei a
compreender que a justiça de Deus é aquela dádiva de Deus segundo a qual vive
um homem justo, ou seja, a fé... agora eu me sentia como se tivesse renascido
completamente, e tivesse entrado no Paraíso”. O mundo inteiro conhece as
consequências deste novo discernimento.
John Wesley
No dia 24 de maio
de 1738, John Wesley anotou no seu Journal. “A noite, eu fui, muito contra a
minha vontade, a uma reunião em Aldersgate Street, onde alguém estava lendo o
prefácio de Lutero para a Epístola aos Romanos. Faltando uns quinze minutos
para as nove, enquanto ele descrevia a mudança que Deus opera no coração por
meio da fé em Cristo, senti o meu coração estranhamente aquecido. Senti que eu
realmente confiava em Cristo, e somente em Cristo, para a salvação: e me foi
dada a certeza de que ele tinha eliminado os meus pecados, os meus, e que ele
tinha me salvado da lei do pecado e da morte”.5 Este foi o momento em que
nasceu o avivamento evangélico do século XVIII.
O que aconteceu
com Agostinho, Lutero e Wesley mudou o rumo da civilização ocidental. Em uma
escala menor, coisas semelhantes podem acontecer conosco, se permitirmos que as
palavras desta Epístola cheguem vivas às nossas mentes e aos nossos corações,
pelo poder do Espírito Santo.