A
doutrina do perdão é um dos grandes pilares dos ensinos do Novo Testamento. Não
é possível ser verdadeiro imitador de Cristo sem o exercício do perdão. Jesus
não apenas perdoou como também ensinou o perdão, seja por parábolas, seja por
ensinos diretos.
O perdão vence os sentimentos de ira e vingança e estabelece a
paz entre Deus e o homem e entre o homem e o seu próximo. Nesta lição
estudaremos a doutrina do perdão e sua importância nas interações humanas.
I.
O QUE É O PERDÃO
1.
Nas línguas bíblicas. O
vocabulário para “perdão” nas Escrituras do Antigo e Novo Testamentos é variado
e rico. No hebraico, salach,
designa a ação misericordiosa de Deus mediante a qual Ele perdoa, desculpa e
livra o pecador da culpa e do castigo advindos pela transgressão (Gn 18.26; Lv
4.20; Nm 14.19; 15.25; Sl 25.18; 32.1,5; 85.2; Rm 4.6-8). No grego, aphiemi, quer dizer “soltar”,
“cancelar”, “remir” e “perdoar” e aparece nos Evangelhos referindo-se ao perdão
dos pecados (Mt 26.28; Mc 2.5; Lc 7.47), de dívidas (Mt 6.12) e “ofensas” (Mc
11.25).
2.
Nos atos e ensinos de Jesus. O perdão
foi ensinado (Mt 6.9-15; 18.25-35; Lc 7.36-50; 15.11-32) e praticado por Jesus
(Mt 9.6; Lc 23.34, 39-42). A pregação das Boas-Novas era o anúncio do perdão
irrestrito ao pecador penitente (Mt 1.21; Mc 10.45). Incluía desde o
cancelamento do efeito do pecado cometido (Mc 2.5; Jo 8.11) à aceitação
graciosa do pecador à comunhão com Deus (Lc 15.20-24). A morte de Jesus Cristo
no Calvário cumpria assim a oferta escatológica do perdão anunciada pelos
profetas (Jr 31.34; 33.8 ver Lc 1.76-79; 4.18,19).
3.
Nos ensinos das epístolas. O perdão
nas epístolas aparece no contexto da doutrina da justificação e da graça divina
(Rm 3.21-26; 5.1,2,6-11). A pessoa não é tão somente perdoada dos pecados e
livre da culpa, mas liberta completamente do poder do pecado sobre ela. O
perdão promove a reconciliação do homem com Deus (Rm 5.10,11; 2Co 5.18-21) e
faz com que o pecador participe da justiça de Cristo em Deus (Rm 3.21-28; 8.1;
9.30; 1Co 1.30,31).
II.
O QUE NÃO É PERDÃO
1.
Não é fraqueza e covardia. Na
perspectiva da filosofia existencialista anticristã, o perdão é visto tanto
como fraqueza quanto covardia, e uma forma de corrupção e domesticação da
natureza do homem por meio da moral cristã. O filósofo ateu F. Nietzsche
entendia os ensinos de Jesus e a ética cristã deste modo. Para ele, o perdão
ensinado por Jesus representava fraqueza e uma maneira de comprar a Deus. Ele
afirmava que “o homem perde poder quando se compadece”.
2.
Não é tolerância ao erro. Outro
pensamento equivocado a respeito do perdão é considerá-lo como tolerância ao
erro. Aquele que perdoa estaria deste modo sendo conivente com o erro, o mal,
ou pecado. Assim, tolerar é compreendido como “consentimento” ou “permissão”.
Todavia, tolerância é suportar o peso do erro de alguém em vez de concordar ou
consentir com o pecado. Quem perdoa não é conivente com o erro que lhe foi
cometido, mas suporta a ofensa e a perdoa.
3.
Não é anular a justiça (Lc 23.39-43). O perdão de
modo algum anula o exercício ou prática da justiça (Dt 16.19). Justiça é dar a
cada um o que lhe é devido (v.41). Está relacionada à ação (Jo 7.24). O perdão
reconhece que a injustiça foi cometida, mas opera para além dela. É uma dádiva.
Na morte de Jesus, entretanto, temos a satisfação da justiça de Deus e a
ministração do perdão divino (Rm 1.17; 3.21-31 ver Mt 21.28-32). Assim, o
perdão e a justiça podem atuar conjuntamente. No caso do ladrão na cruz, a
justiça veio primeiro e, depois, o perdão (Lc 23.39-43). O perdão opera na
esfera do sentimento e da subjetividade, a justiça, no entanto, é concreta e
objetiva.